domingo, 24 de agosto de 2008

Quero Ser Tambor

Tambor está velho de gritar Oh velho Deus dos homens deixa-me ser tambor corpo e alma só tambor gritando na noite quente dos trópicos.

Nem flor nascida no mato do desespero Nem rio correndo para o mar do desespero Nem zagaia temperada no lume vivo do desespero Nem mesmo poesia forjada na dor rubra do desespero.

Nem nada!

Só tambor velho de gritar na lua cheia da minha terra Só tambor de pele curtida ao sol da minha terra Só tambor cavado nos troncos duros da minha terra.

Eu
Só tambor rebentando o silêncio amargo da Mafalala
Só tambor velho de sentar no batuque da minha terra
Só tambor perdido na escuridão da noite perdida.

Oh velho Deus dos homens
eu quero ser tambor
e nem rio
e nem flor
e nem zagaia por enquanto
e nem mesmo poesia.
Só tambor ecoando como a canção da força da vida
Só tambor noite e dia
dia e noite só tambor
até a consumação da grande festa do batuque!
Oh velho Deus dos homens
deixa-me ser tambor
só tambor!

José Craveirinha

Poeta moçambicano.

Mafalala: Bairro da capital de Moçambique.
Zagaia: Lança curta de arremesso.

3 comentários:

ON THE É (nada do que não era antes, quando não somos mutantes) disse...

parabéns pelo teu blog, pela tua luta travada no meio do seu seio verboemotionrabração
Cgurgel

Clóvis Campêlo disse...

Maravilhosas mulheres e seus tambores nada silenciosos.

MARIAESCREVINHADORA disse...

Belo poema e bela foto.
Abraços,

Conceição