quarta-feira, 30 de setembro de 2009

Uma estranha realidade
De mundos superpostos
Essa em que vivemos...
Enquanto escovo os dentes
A morte me espreita
Na porta do banheiro.

Carlos Maia
1980.
Os cactos florescem
Na terra vermelha
E dão frutos azuis e
As borboletas voam
Sobre as passarelas
Enquanto eu passo
Por essa borboleta
Do ônibus e o cobrador
Me dá o troco.

Carlos Maia
1980.

Edf. José Bonifácio.

Nascida da espera
de um esperma
num protozoário,
em busca
do óvulo incansável,
sentado numa cadeira vermelha
no edifício José Bonifácio;
não sei o que faço,
é difícil...
não sei se fico,
não sei se parto!

Carlos Maia
1981.

quinta-feira, 24 de setembro de 2009

Vivendo com Propósitos - Ed René Kivitz.

"No momento em que você acorda todas as manhãs,
todos os seus desejos e esperanças para o dia
correm para você como animais selvagens.
E a primeira tarefa de cada manhã consiste
em enxotá-los todos de volta;
e ouvir aquela outra voz,
observar aquele outro ponto de vista,
deixando que aquela outra vida, maior,
mais poderosa e mais calma
venha fluindo para dentro."
(C. S. Lewis)

pg. 110

Yoga Caminho para Deus - Hermógenes.

Estás vendo aquele desgraçado maluco, carregando
apegadamente latas velhas, papéis sujos, caixas
vazias, pedaços de pau e tantas prezadas
inutilidades?
Ele é expressivo símbolo do sentimento tão comum,
tão humano, tão vulgar de "estas coisas são minhas!"

Tudo aquilo é o que lhe garante a ilusão de que
é proprietário.
Iludido, às inutilidades ele se apega.
Do alto de nossa soberba, nós o julgamos doido
e o achamos ridículo.

Mas, será que, em nossa famigerada normalidade
ou sanidade, não fazemos exatamente o mesmo,
e sob a tensão do apego, sob a paixão de
manter, ridiculamente vinculados estamos
a nossas pseudopropriedades???

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Auto analisa-te.
A cada instante busca atingir os motivos
profundos - não os periféricos - que te fazem agir,
sentir, falar, pretender, orar...
Tê muita coragem.
Sê prudente.
Não te deixes iludir.
Desde já, fica sabendo - és tu mesmo,
e não os outros,
que melhor te iludes.

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Estás mesmo em condições para um encontro
com a Verdade, esta Verdade que dizes querer?
Ela liberta, mas fere, machuca, ofusca,
consome, queima, desconforta...

Se algumas pequenas supostas-verdades
particulares ainda parecem ameaças
a teu conforto e à tua segurança,
se ainda te incomodam,
como podes supor que aspiras
à Verdade?

Pgs. 70-71

terça-feira, 22 de setembro de 2009

Para os Saudosistas.

Essa foto é de Gaibú - 1979.
Observem o detalhe de que Enseada dos
Corais era apenas mata e coqueiros.
A estrada era de terra e íamos de Recife
ao Cabo de trem, e depois
pegávamos um pau-de-arara do Cabo
até Gaibú.
Dormíamos pelos terraços...

Aprendendo com a Dor - Nélio da Silva.

Você nunca será a pessoa que poderá ser se dores,
pressões, tensões e disciplinas forem retiradas
da sua vida. (James G. Bilkey)

Dor é uma lição esperando ser compreendida e
aprendida. Ao nos submetermos ao ensino
dessa grande lição, podemos transcender a própria
dor. Se você tocar um ferro quente, sentirá
uma dor terrível. Se você negligenciar
o aprendizado desta experiência,
a dor voltará todas as vezes que você tocar
o ferro quente.

Quando você aprende a lição de que a dor
tem algo a ensinar, e ao evitar tocar o ferro quente,
você certamente não terá que suportar
aquela dor novamente. O que é que você pode
aprender com as dores que esta vida lhe causa?
Em cada dor existe uma lição.
Algumas vezes a lição é evitar cometer os mesmos
ou novos erros. Em outras ocasiões é a lição
de aprender a aceitar, valorizar e triunfar sobre os
desafios que temos à nossa frente.

Você já aprendeu que, nesta vida, é impossível
conseguir algo em troca de nada?
Ou a sua dor ainda está tentando ensinar-lhe isso?
Você já aprendeu a viver com foco e
propósito?
Ou continua a resistir às preciosas lições que
uma dor pode ensinar-lhe?
Liberte-se da dor ao aprender aquilo que
ela está pronta a lhe ensinar.

Para Meditação:

Bem-aventurado o homem cuja força está em ti,
em cujo coração se encontram os caminhos
aplanados, o qual, passando pelo vale árido, faz
dele um manancial; de bençãos o cobre
a primeira chuva. (Salmos 84:5-6)

segunda-feira, 21 de setembro de 2009

Dentro e Fora - Luan Jessan.

Por fora
tenho tantos anos
que você nem acredita.
Por dentro, doze ou menos,
e me acho mais bonita.
Por fora, óculos;
algumas rugas,
gordurinhas,
prata nos tintos cabelos.
Por dentro sou dourada,
Alma imaculada,
corpo de modelo.
Por fora, em aluviões,
batem paixões contra o peito.

Paixões por versos, pinturas,
filosofia e amigos sem despeito.
Por dentro, sei me cuidar,
vivo a brincar, meio sem jeito.
Não me derrota a tristeza;
não me oprime a saudade;
não me demoro padecente.
E é por viver contente
que concluo sem demora:
é a menina
que vive por dentro,
que alegra
a mulher de fora!

domingo, 20 de setembro de 2009

Breve diálogo entre Leonardo Boff e Dalai Lama.

No intervalo de uma mesa redonda sobre religião
e Paz entre os povos, na qual ambos participávamos,
eu, maliciosamente, mas também com interesse
teológico, lhe perguntei em meu inglês capenga:
- "Santidade, qual é a melhor religião?"

Esperava que ele dissesse: "é o budismo tibetano" ou
"são as religiões orientais muito mais antigas do
que o cristianismo."

O Dalai Lama fez uma pequena pausa, deu um
sorriso, me olhou bem nos olhos - o que me
desconcertou um pouco, porque eu sabia da malícia
contida na pergunta - e afirmou:

"A melhor religião é a que mais te aproxima de
Deus. É aquela que te faz melhor."

Para sair da perplexidade de tão sábia resposta,
voltei a perguntar:
- "O que me faz melhor?"
Respondeu ele:
-"Aquilo que te faz mais compassivo (e aí senti
a ressonância tibetana, budista, taoísta
de sua resposta), aquilo que te faz mais sensível,
mais desapegado, mais amoroso, mais humanitário,
mais responsável... A religião que conseguir
fazer isso de ti é a melhor religião..."

Calei, maravilhado, e até os dias de hoje
estou ruminando sua resposta sábia e irrefutável.

sexta-feira, 18 de setembro de 2009

Sua Opção - Nélio da Silva.

"Nós somos continuamente confrontados com grandes
oportunidades brilhantemente disfarçadas
de problemas insolúveis." (Lee Iacocca)

Você pode optar por desejar e esperar que tudo
na vida venha a ser perfeito.
Ou você pode fazer com que as coisas possam ficar
melhores e melhores.
Você pode lamuriar que a vida é imperfeita e
lamentar que o melhor da vida já passou por você,
ou você pode fazer ainda o melhor com a sua vida.

Você pode fazer uma lista de todas as coisas
que você não tem.
Ou você pode fazer bom uso de todas as coisas
boas e valiosas que você já tem.
Você pode se preocupar por não ter tempo
e recursos para fazer tudo o que deseja fazer.
Ou você pode fazer o seu melhor com o tempo
e os recursos que estão à sua disposição.

Você pode permitir que os retrocessos e
desapontamentos lhe coloquem para baixo.
Ou você pode se concentrar na soberania de Deus
e continuar os seus esforços com uma
positiva determinação.
Você pode se sentar e apenas observar a vida
acontecendo ao seu redor.
Ou fazer da sua vida algo essencialmente precioso
ao deixar para trás um legado inestimável.
A opção é apenas sua.

Para meditação:
Será que você não sabe? Nunca ouviu falar?
O Senhor é o Deus eterno, o Criador de
toda a terra. Ele não se cansa nem fica exausto;
sua sabedoria é insondável. (Isaías 40:28-29)

sábado, 12 de setembro de 2009

Plantei uma pequena semente
que originaria talvez
uma grande árvore,
A semente tinha dois tendões:
Um se estendia até o infinito
e o outro se estendia até o começo.
Antes que o começo
gerasse o infinito,
vieram os pássaros
e devoraram as sementes.
Será que ao lançar
novas sementes, elas cairão
em solo fértil?
Ou serão novamente
devoradas pelos pássaros,
e ficarão no aconchego
dos ninhos?

Ivaldo Evangelista
25/08/96.

Buscando o porquê - Nélio da Silva

Quando a razão do porquê é suficientemente grande,
você poderá encontrar a força e a coragem
necessárias para fazer aquilo que tem de ser feito.
Se a razão do porquê tem o peso que deve ter
você terá a persistência que o levará a atingir o alvo
que tanto almeja.

Apesar de parecerem os obstáculos grandes demais
para serem transpostos, uma forte razão o
induzirá a ultrapassá-los.
Um motivo claro e determinado irá providenciar-lhe
o encorajamento indispensável, a fim de que
você consiga atingir seus alvos.

Conheça, compreenda e se conecte com o significativo
"porquê", e você encontrará a maneira de
encontrar o que busca.

Para meditação:

"E não nos cansemos de fazer o bem, pois no tempo
próprio colheremos, se não desanimarmos."
(Gálatas 6:9)
Cinzas hão de cair
do meu cigarro inseguro,
não obstante,
me aventuro a virar fumaça.
Sofro a minha desgraça
com cápsula de cianureto
Eis aqui o meu amuleto
escondido por entre
os dentes risonhos da morte,
a serpente.
Um só trago de repente
piso o chão,
minh'alma salta
crucificada nos abrolhos
orbitais que cintilam
Quebro a raiz da mentira
com verdades frenéticas.

Ivaldo Evangelista
25/08/96.

sexta-feira, 11 de setembro de 2009

Apenas um peixe,
algas cianofíceras,
moneras,
símbolo de fortaleza no mar.
Novamente cianofíceras algas,
vejo com esplendor
através de anteparos de vidro
posso me sentir Netuno
na exploração psico-cinética,
mas o meu arpão, límpido, seguro,
derrama sangue pelas águas
quando atinge o dorso de um mero.
Sinto o desespero,
por ter destruído criatura,
num só fôlego,
algo que a natureza levou 40 anos
para desenvolver,
chorei por trás do visor
por ter danificado a minha
natureza interior.

Ivaldo Evangelista
25/08/96.

quinta-feira, 10 de setembro de 2009

No Caminho, com Maiakóvski - Eduardo Alves da Costa

Assim como a criança
humildemente afaga
a imagem do herói,
assim me aproximo de ti, Maiakóvski.
Não importa o que me possa acontecer
por andar ombro a ombro
com um poeta soviético.
Lendo teus versos,

aprendi a ter coragem.

Tu sabes,
conheces melhor do que eu
a velha história.
Na primeira noite eles se aproximam
e roubam uma flor
do nosso jardim.
E não dizemos nada.


Na segunda noite, já não se escondem:
pisam as flores,
matam nosso cão,
e não dizemos nada.
Até que um dia,
o mais frágil deles
entra sozinho em nossa casa,
rouba-nos a luz, e,
conhecendo nosso medo,
arranca-nos a voz da garganta.

E já não podemos dizer nada.

Nos dias que correm
a ninguém é dado
repousar a cabeça
alheia ao terror.
Os humildes baixam a cerviz;
e nós, que não temos pacto algum
com os senhores do mundo,
por temor nos calamos.


No silêncio de meu quarto
a ousadia me afogueia as faces
e eu fantasio um levante;
mas amanhã,
diante do juiz,
talvez meus lábios
calem a verdade
como um foco de germes

capaz de me destruir.
Olho ao redor
e o que vejo
e acabo por repetir
são mentiras.
Mal sabe a criança dizer mãe
e a propaganda lhe destrói a consciência.


A mim, quase me arrastam
pela gola do paletó
à porta do templo
e me pedem que aguarde
até que a Democracia
se digne aparecer no balcão.
Mas eu sei,
porque não estou amedrontado
a ponto de cegar, que ela tem uma espada
a lhe espetar as costelas
e o riso que nos mostra
é uma tênue cortina

lançada sobre os arsenais.
Vamos ao campo
e não os vemos ao nosso lado,
no plantio.


Mas ao tempo da colheita
lá estão
e acabam por nos roubar
até o último grão de trigo.
Dizem-nos que de nós emana o poder
mas sempre o temos contra nós.
Dizem-nos que é preciso
defender nossos lares
mas se nos rebelamos contra a opressão

é sobre nós que marcham os soldados.

E por temor eu me calo,
por temor aceito a condição
de falso democrata
e rotulo meus gestos
com a palavra liberdade,
procurando, num sorriso,
esconder minha dor
diante de meus superiores.
Mas dentro de mim,
com a potência de um milhão de vozes,

o coração grita - MENTIRA!
Depositei o tempo aos meus pés
E caminhei entre as estrelas
Como quem passeia
Entre os girassóis...
A chama azul
brilhava novamente,
E pude contemplar
o incogniscível...

Meu Pai,
Sei que estás
me vendo agora
contemplando a vela,
Eu também te vejo
na chama dela...

Carlos Maia
10/09/09

quarta-feira, 9 de setembro de 2009

O Ato Gratuito - Clarice Lispector.

Muitas vezes o que me salvou foi improvisar um ato gratuito. Ato gratuito, se tem causas, são desconhecidas. E se tem conseqüências, são imprevisíveis.

O ato gratuito é o oposto da luta pela vida e na vida. Ele é o oposto da nossa corrida pelo dinheiro, pelo trabalho, pelo amor, pelos prazeres, pelos táxis e ônibus, pela nossa vida diária enfim – que esta é toda paga, isto é, tem o seu preço.

Uma tarde dessas, de céu puramente azul e pequenas nuvens branquíssimas, estava eu escrevendo a máquina – quando alguma coisa em mim aconteceu.

Era o profundo cansaço da luta.

E percebi que estava sedenta. Uma sede de liberdade me acordaria. Eu estava simplesmente exausta de morar num apartamento. Estava exausta de tirar idéias de mim mesma. Estava exausta do barulho da máquina de escrever. Então a sede estranha e profunda me apareceu. Eu precisava – precisava com urgência – de um ato de liberdade: do ato que é por si só. Um ato que manifestasse fora de mim o que eu secretamente era. E necessitava de um ato pelo qual eu não precisava pagar. Não digo pagar com dinheiro mas sim, de um modo mais amplo, pagar o alto preço que custa viver.

Então minha própria sede guiou-me. Eram 2 horas da tarde de verão. Interrompi meu trabalho, mudei rapidamente de roupa, desci, tomei um táxi que passava e disse ao chofer: vamos ao Jardim Botânico. “Que rua?” perguntou ele. “O senhor não está entendendo”, expliquei-lhe “não quero ir ao bairro e sim ao Jardim do bairro.” Não sei por que olhou-me um instante com atenção.

Deixei abertas as vidraças do carro, que corria muito, e eu já começara minha liberdade deixando que um vento fortíssimo me desalinhasse os cabelos e me batesse no rosto grato de olhos entrefechados de felicidade.

Eu ia ao Jardim Botânico para quê? Só para olhar. Só para ver. Só para sentir. Só para viver.

Saltei do táxi e atravessei os largos portões. A sombra logo me acolheu. Fiquei parada. Lá a vida verde era larga. Eu não via ali nenhuma avareza: tudo se dava por inteiro ao vento, no ar, à vida, tudo se erguia em direção ao céu. E mais: dava também o seu mistério.

O mistério me rodeava. Olhei arbustos frágeis recém-plantados. Olhei uma árvore de tronco nodoso e escuro, tão largo que me seria impossível abraça-lo. Por dentro dessa madeira de rocha, através de raízes pesadas e duras como garras – como é que corria a seiva, essa coisa quase intangível e que é vida? Havia seiva em tudo como há sangue em nosso corpo.

De propósito não vou descrever o que vi: cada pessoa tem que descobrir sozinha. Apenas lembrarei que havia sombras oscilantes, secretas. De passagem falarei de leve na liberdade dos pássaros. E na minha liberdade. Mas é só. O resto era o verde úmido subindo em mim pelas minhas raízes incógnitas. Eu andava, andava. Às vezes parava. Já me afastara muito do portão de entrada, não o via mais, pois entrara em tantas alamedas. Eu sentia um medo bom – como um estremecimento apenas perceptível de alma – um medo bom de talvez estar perdida e nunca mais, porém nunca mais! achar a porta de saída.

Havia naquela alameda um chafariz de onde a água corria sem parar. Era uma cara de pedra e de sua boca jorrava a água. Bebi. Molhei-me toda. Sem me incomodar: esse exagero estava de acordo com a abundância do Jardim.

O chão estava às vezes coberto de bolinhas de ararueira, daquelas que caem em abundância nas calçadas de nossa infância e que pisávamos não sei por quê, com enorme prazer. Repeti então o esmagamento das bolinhas e de novo senti o misterioso gosto bom.

Estava com um cansaço benfazejo, era hora de voltar, o sol já estava mais fraco.

Voltarei num dia de muita chuva – só para ver o gotejante jardim submerso.

______________________

Nota: peço licença para pedir à pessoa que tão bondosamente traduz meus textos em Braile para os cegos que não traduza este. Não quero ferir olhos que não vêem.

8 de Abril de 1972.

Extraído do livro:

"A Descoberta do Mundo"