quinta-feira, 12 de novembro de 2009

A Carta do Índio Chefe Seattle - "Manifesto da Terra-Mãe"

Já passaram muitos anos desde que foi escrita,
apesar disso, a carta que se segue, não só
continua atual como consubstancia uma crescente
preocupação do homem de hoje.
Foi em 1854 que o chefe Seattle, da tribo Suquamish,
do Estado de Washington, depois de o governo
norte americano ter proposto a compra do território
ocupado por aqueles índios, respondeu ao presidente
dos Estados Unidos endereçando-lhe a missiva
que se anexa. A mesma foi divulgada pela UNESCO
em 1976, quando das comemorações do
Dia Mundial do Ambiente.
Não está defasada das nossas preocupações estéticas
e culturais a questão ambiental ainda que esta
temática tenha campo próprio, assim nesse contexto
e ainda pela beleza do texto aqui lhe
disponibilizamos a carta.
Quinhentos anos depois da chegada de Pedro Álvares
Cabral a Porto Seguro no Brasil, a preocupação do
chefe Seattle, natural que era daquele continente,
e sem pretender alimentar polêmicas de qualquer
espécie, revelou então uma preocupação à qual
felizmente cada vez mais homens e mulheres de hoje,
independentemente do credo filosófico ou religioso
com que se identificam, da raça ou do continente
em que se insiram, dão maior importância.
E a causa ecológica passou a ser causa dos povos,
e não só do chefe índio.
Ao chefe Seattle coube a glória de com o seu perspicaz
olhar de homem selvagem, como ele próprio
se intitula, habituado que estava a visualizar o horizonte
em busca de bisontes que alimentassem a sua tribo,
ter vislumbrado antes de todos a importância da
terra mãe para o homem.
E viu com o seu arguto olhar que a terra é nossa mãe
e o sol nosso pai,
e que podem um dia zangar-se!

Eis o texto da carta:

"Como podeis comprar ou vender o céu, o calor da terra?
A idéia não tem sentido para nós.
Se não somos donos da frescura do ar ou o brilho
das águas, como podeis querer comprá-los?
Qualquer parte desta terra é sagrada para meu povo.
Qualquer folha de pinheiro, cada grão de areia
nas praias, a neblina nos bosques sombrios,
cada monte e até o zumbido do inseto,
tudo é sagrado na memória e no passado do meu povo.
A seiva que percorre o interior das árvores leva em si
as memórias do homem vermelho.
Os mortos do homem branco esquecem a terra
onde nasceram, quando empreendem
as suas viagens entre as estrelas;
ao contrário os nossos mortos jamais esquecem
esta terra maravilhosa,
pois ela é a mãe do homem vermelho.

Somos parte da terra e ela é parte de nós.
As flores perfumadas são nossas irmãs,
os veados, os cavalos, a majestosa águia,
todos nossos irmãos.
Os picos rochosos, a fragrância dos bosques,
o calor do corpo do cavalo e do homem,
todos pertencem à mesma família.
Assim, quando o grande chefe em Washington
envia mensagem manifestando o desejo de comprar
as nossas terra,
está a pedir demasiado de nós.
O grande Chefe manda dizer ainda que nos reservará
um sítio onded possamos viver
confortavelmente uns com os outros.
Ele será nosso pai e nós seremos seus filhos.
Se assim é, vamos considerar a sua proposta sobre
a compra de nossa terra.
Isto não é fácil, já que esta terra é sagrada para nós.

A límpida água que corre nos ribeiros e nos rios
não é apenas água,
mas o sangue de nossos antepassados.
Se lhes vendemos a terra, recordar-se-á e lembrará
aos vossos filhos que ela é sagrada,
e que cada reflexo nas claras águas evoca
eventos e fases da vida do meu povo.
O murmúrio das águas é a voz do pai do meu pai.

Os rios são nossos irmãos, e saciam a nossa sede.
Levam as nossas canoas e alimentam os nossos filhos.
Se lhes vendermos a terra, deveis lembrar
e ensinar aos vossos filhos que os rios são nossos
irmãos, e também o são deles,
e deveis a partir de então dispensar aos rios
o mesmo tratamento e afeto que dispensais
a um irmão.

Nós sabemos que o homem branco não entende
o nosso modo de ser.
Ele não sabe distinguir um pedaço de terra
de outro qualquer, pois é um estranho que vem de
noite e rouba da terra tudo de que precisa.
A terra não é sua irmã,
mas sua inimiga, depois de vencida e conquistada,
ele vai embora, à procura de outro lugar.
Deixa atrá de si a sepultura de seus pais
e não se importa.
A cova de seus pais é a herança de seus filhos,
ele os esquece.
Trata a sua mãe, a terra,
e seu irmão, o céu, como coisas que se compram,
como se fossem peles de carneiro
ou brilhantes contas sem valor.
O seu apetite vai exaurir a terra,
deixando atrás de si só desertos.
E isso eu não compreendo.

O nosso modo de ser é completamente diferente
do vosso. A visão de vossas cidades faz doer
os olhos do homem vermelho.
Talvez seja porque o homem vermelho é um
selvagem e não compreende...
Nas cidades do homem branco não há um só
lugar onde haja silêncio, paz.
Um só lugar onde ouvir o desabrochar das
folhas na primavera, o zunir das asas de um inseto.
Talvez seja porque sou um selvagem e não
posso compreender.
O vosso ruído insulta os nossos ouvidos.
Que vida é essa onde o homem não pode ouvir
o pio solitário da coruja ou o coaxar das rãs
nas margens dos charcos
e ribeiros ao cair da noite?
O índio prefere o suave sussurrar do vento
esfolando a superfície das águas do lago,
ou a fragrância da brisa,
purificada pela chuva do meio dia
e aromatizada pelo perfume dos pinhais.

O ar é inestimável para o homem vermelho, pois
dele todos se alimentam.
Os animais, as árvores, o home, todos respiram
o mesmo ar. O homem branco parece não se
importar com o ar que respira.
Como um cadáver em decomposição,
ele é insensível ao mau cheiro.
Mas se vendermos nossa terra, deveis recordar
que o ar é precioso para nós,
que o ar insufla seu espírito em todas as coisas
que dele vivem.
O vento que deu aos nossos avós o primeiro
sopro de vida é o mesmo
que lhes recebe o último suspiro.
Se vendermos nossa terra a vós, deveis conservá-la
à parte, como sagrada, como um lugar onde
mesmo um homem branco possa ir saborear a brisa
aromatizada pelas flores dos bosques.

Por tudo isto consideraremos a vossa proposta de
comprar nossa terra.
Se nos decidirmos a aceitá-la, eu porei uma condição:
O homem branco terá que tratar os animais desta
terra como se fossem seus irmãos.
Sou um selvagem e não compreendo outro modo
de vida. Tenho visto milhares de bisontes
apodrecendo nas pradarias, mortos a tiro pelo
homem branco de um comboio
em andamento.
Sou um selvagem e não compreendo como
o fumegante cavalo de ferro possa ser mais importante
que o bissonte, que nós caçamos apenas
para sobreviver.
Que será dos homens sem os animais?
Se todos os animais desaparecem,
o homem morrerá de solidão espiritual.
Porque o que suceder aos animais afetará os homens.
Tudo está ligado.
Deveis ensinar a vossos filhos que o solo que pisam
são as cinzas de nossos avós.
Para que eles respeitem a terra, ensina-lhes que
ela é rica pela vida dos seres de todas
as espécies. Ensinai aos vossoa filhos o que
nós ensinamos aos nossos:
Que a terra é a nossa mãe.
Quando o homem cospe sobre a terra,
cospe sobre si mesmo.
De uma coisa nós temos certeza:
A terra não pertence ao homem branco;
o homem branco é que pertence à terra.
Disso nós temos a certeza.
Todas as coisas estão relacionadas como o sangue
que une uma família.
Tudo está associado.
O que fere a terra fere também aos filhos da terra.
O homem não tece a teia da vida: é antes um
dos seus fios. O que quer que faça a essa teia,
faz a si próprio.

Nem mesmo o homem branco, cujo Deus passeia
e fala com ele como um amigo,
não pode fugir a esse destino comum.
Por fim talvez, e apesar de tudo, sejamos irmãos.
Uma coisa sabemos, e que talvez o homem branco
venha a descobrir um dia:
o nosso Deus é o mesmo Deus.
Hoje pensais que Ele é só vosso, tal como desejais
possuir a terra, mas não podeis.
Ele é o Deus do homem e sua compaixão é igual
tanto para o homem branco,
quanto para o homem vermelho.

Esta terra tem um valor inestimável para Ele,
e ofender a terra é insultar o seu Criador.

Também os brancos acabarão um dia talvez mais
cedo do que todas as outras tribos.
Contaminai os vossos rios e uma noite morrerão
afogados nos vossos resíduos.
Contudo, caminhareis para a vossa destruição,
iluminados pela força do Deus que vos trouxe a esta
terra e por algum desígnio especial vos deu
o domínio sobre ela e sobre o homem vermelho.
Este destino é um mistério para nós, pois não
compreendemos como será no dia em que o último
bisonte for dizimado, os cavalos selvagens
domesticados, os secretos recantos das florestas
invadidas pelo odor do suor de muitos homens
e a visão das brilhantes colinas bloqueada
por fios falantes.

Onde está o matagal?
Desapareceu.
Onde está a águia?
Desapareceu.

Termina a vida começa a sobrevivência."

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